sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Rei do Campo (Ronald do Botafogo)


Ronald é destacado como o "Rei do Campo" (circa 1959).

"Sabemos pouco" - é o João quem diz


Eis aí a crônica do João Saldanha em que destaca Ronald, Zagalo, Fontana e Gérson como os quatro jogadores com maior "visão de jogo". "Sabemos pouco" foi publicada pelo Jornal do Brasil em 20/09/1980.

Ronald substitui Nilton Santos - Botafogo


Mais de 50 anos de amizade unem Ronald e Nilton Santos. Na foto, publicada pelo Jornal do Brasil no dia 01/12/1960, Nilton, contundido, brinca com Ronald, que iria substituí-lo: "Não vai me barrar, não, ein, Rolête!"

Bicicleta espetacular de Ronald - Botafogo


O Diário da Noite destaca a "defesa segura" do Botafogo e a "espetacular bicicleta" de Ronald, durante jogo no Maraca contra o São Paulo, em 58/59.

Bacharéis da Pelota de 1957 - Botafogo


A lista dos "Bacharéis da Pelota" foi publicada pelo Jornal dos Sports em 1957, quando da conquista do Campeonato Carioca. Clique na imagem para ver com detalhe.

sábado, 21 de novembro de 2009

Ronald "Marreta" Alzuguir


RONALD SEGUNDO JOÃO SALDANHA
João Saldanha costumava alardear (e chegou a publicá-lo numa crônica que emblematicamente intitulou de “Sabemos pouco”) que o jogador Ronald Alzuguir, entre todos os jogadores com que havia lidado, era “um dos quatro que mais se destacavam”. Segundo ele, mal o rapaz entrava em campo, já sabia “de cara o que estava acontecendo” e o que deveria fazer. Tinha a chamada “visão de jogo”. Um comentário como esse não é pouco, visto que João, em sua vitoriosa carreira como técnico do Botafogo e da Seleção Brasileira, lidou com os melhores jogadores de seu tempo.
“CRAQUE PERFEITO”
Apesar de eleito um dos Bacharéis da Pelota pelo Jornal dos Sports em 57, ao lado dos colegas Didi, Nilton Santos e Quarentinha, entre outros, e cogitado para integrar a (por fim vitoriosa) Seleção Brasileira de 58, Ronald se tornou com o tempo um nome praticamente desconhecido. Fera da zaga alvinegra nos anos 50, habitué nas manchetes do rosado como o “Craque Perfeito”, o “Craque Doutor”, ou, ainda, o “Doutorzinho do Botafogo”, pendurou as chuteiras no momento em que começaria a colher os frutos de uma juventude dedicada ao futebol. Quando decidiu abraçar a Odontologia com exclusividade, ele tinha apenas 25 anos de idade. E quase 20 de paixão pela pelota!
O “MARRETA” DE COPACABANA
Nascido em 1937 no Posto 6 de Copacabana, no Rio de Janeiro, Ronald é o caçula dos sete filhos de Salim e Maria Hanna Alzuguir (ele libanês, ela egípcia), moradores pioneiros do bairro. Ainda moleque, aos 14 anos, foi levado ao Flamengo pelo irmão Nabih, jogador do clube, “cria” do mestre Zizinho e enaltecido em jornal como o “Leônidas Branco”. Lá, Ronald se integrou às categorias de base, disputando os Jogos Infantis patrocinados pelo Jornal dos Sports de Mário Filho.
Há muito, no entanto, destacava-se nas peladas e campeonatos de praia em Copacabana (os famosos “rachas”), com o sensível apelido de “Marreta”. Adolescente, era praticamente um veterano da areia, com passagens por quase todos os times da época, como Lá Vai Bola, Huracán, Dínamo, Pracinha, Ouro Preto e Yankee. Logo chamaria a atenção do lendário Neném Prancha, o “filósofo do futebol”. Antes de habitar com suas teses pitorescas as crônicas de Armando Nogueira e Nelson Rodrigues, Neném andava por ali, de olho comprido na garotada, pescando os talentos mais promissores para o seu time, o popularíssimo Americano – com direito a camisas idênticas às do Boca Júnior, lavadas e passadas com capricho pelo próprio técnico. Pelas mãos de Neném, também técnico e roupeiro dos times de base do Botafogo, Ronald foi apresentado ao clube e converteu-se para sempre à Estrela Solitária.
AOS 18 ANOS, ESTREIA MEMORÁVEL NO MARACANÃ
Em quase dez anos de atuação como quarto-zagueiro pelo Botafogo, Ronald fez nome nas categorias Infantil (vencendo os Jogos Infantis de 52), Infanto-Juvenil e Juvenil, sempre como capitão do time. Convidado pelo treinador Efigênio Bahiense, o histórico ex-jogador alvinegro Geninho, estreou no Profissional sem passar pelo Aspirantes, aos 18 anos, num amistoso em General Severiano contra o time sueco AIK. A responsabilidade do garoto era dupla, pois enfrentava a arena principal, pela primeira vez, com a missão de ocupar a vaga do veterano José Carlos Bauer, craque do São Paulo e (eleito) melhor jogador da Copa de 50 - que encerrava sua carreira no Glorioso. E não fez feio. Tanto que, no mesmo ano, substituiria Bauer novamente, dessa vez no Maracanã. Sua estreia no maior estádio do mundo, façanha pouquíssimo comum na época para um jogador tão jovem, foi memorável. Segundo reportagem do comentarista Luiz Mendes, “meteram o garoto numa podre, mas ele entrou e mudou a cara do jogo (que ia de mal a pior, com placar de 3 a 1 favorável ao Fluminense). Teve uma atuação soberba e graças a ele o Botafogo fez três gols, de João Carlos, Garrincha e Didi. Ele foi o nome do jogo, levando sua equipe ao glorioso empate que parecia impossível.”
CAMPEÃO CARIOCA DE 1957
Apenas dois anos depois, em 57, o auge: Ronald foi Campeão Carioca ao lado de Garrincha, Nilton Santos, Quarentinha e Didi, tendo João Saldanha como treinador. Inspirado na compleição sólida e na disposição a toda prova do garoto (“-Isto é treino, Ronald! Guarde metade dessa fome pra domingo!”), João cunhou-lhe um novo apelido: Rolête.
RONALD ATUA NOS MELHORES ESTÁDIOS DO MUNDO PELO BOTAFOGO
Em meados de 59, Ronald carimbou o passaporte freneticamente, numa exaustiva turnê de três meses pela Europa, onde suou a camisa nº 4 em estádios como San Siro, Olímpico de Roma, Santiago Bernabéu e Olímpico de Helsinki. Nas mais de vinte partidas de que participou, não deu colher chá para craques como Evaristo (Barcelona), Puskas, Vavá, Canário, Del Sol, Gento (Atlético de Madri) e Liedholm (Milan), capitão da seleção sueca - a nata de atacantes da Europa. Em La Coruña, dificultou a vida de Pelé naquele que a imprensa batizou de Jogo do Século: Santos de um lado, Botafogo (com Garrincha) do outro. A medalha Tereza Herrera de prata conquistada na partida está até hoje presa no seu chaveiro. Era a melhor fase do Rolête e do próprio Botafogo.
PRIMEIRO ALUNO E ORADOR DA TURMA
Em dezembro de 59, os jornais se admirariam em letras garrafais: “Ronald, medalha de ouro e orador da turma, sai doutor”. Era verdade, o promissor Rolête do Botafogo tinha levado sua vida-dupla profissional às últimas conseqüências: formava-se naquele ano pela Faculdade Nacional de Odontologia (então na Praia Vermelha), como 1º aluno de sua turma. Não bastasse o prêmio internacional obtido num convênio com uma faculdade argentina, foi homenageado pelo Botafogo com um jantar comemorativo na sede do clube (festejo que contou com a presença dos muitos Alzuguires e de toda a diretoria alvinegra).
APOSENTADORIA PRECOCE
Por quase dois anos, Ronald ainda conseguiu conciliar pré-molares e gramados, numa rotina extenuante. Em 61, deixou o Botafogo por divergências profissionais, sendo levado pelo treinador Tim (que o tinha convocado anteriormente para a Seleção Carioca de Novos) para o Guarani de Campinas. Em 62, por fim, voltou ao time de origem, o Flamengo, que passava por uma reformulação sob comando de Flávio Costa. Depois de mais uma excursão internacional, que incluiu Europa, União Soviética (Leningrado, Moscou e Odessa) e África (Tunísia e Gana), Ronald disse adeus a uma carreira em ascenção, numa idade em muitos jogadores estão apenas começando. Continuou no Flamengo por vários anos, mas como cirurgião dentista, junto ao Departamento Médico do clube.
Apesar de duríssimo na marcação (daí os apelidos de Marreta e Rolête), o dr. Ronald Alzuguir tornaria-se célebre entre seus clientes pela suavidade no manejo de injeções, ferrinhos e brocas. A única reclamação deve-se, até hoje, à sua mania de contar histórias engraçadas quando o ouvinte, enganchado no sugador de saliva, se encontra impossibilitado de rir.
ETERNA PAIXÃO PELA PELOTA
Aos poucos, Ronald deixaria a cena esportiva para tornar-se, além de dentista, um comentarista informal cheio de verve. Preferindo para acompanhamento dos jogos o indefectível radinho de pilha à tevê, sabe tudo o que se passa (e o que se passou) no meio futebolístico, e compartilha suas histórias e opiniões com amigos de fé como o locutor Luiz Mendes, parceiro de mesa no restaurante Meia Pataca, em Copacabana.
Seus diários de viagem e depoimentos serviram de fonte de pesquisa (“preciosa”, segundo o escritor Ruy Castro) para o livro “Garrincha: Estrela Solitária”.
Ronald reside atualmente no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro. Com a esposa Izaura, tem dois filhos, Renata e Rodrigo, e uma neta, Manuela.
(Para os curiosos, os outros três jogadores destacados por João Saldanha são Gerson, Zagalo e Fontana.)

Texto de Rodrigo Alzuguir